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21 abril 2013

Os "debates"...

É já de ontem o artigo de Vasco Pulido Valente que aqui reproduzimos, e ao qual ele deu o título “Os dois “debates” da televisão”
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Com a mordacidade do costume VPV continua igual a si próprio.

Vasco Pulido Valente
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As televisões (sete ou oito canais) têm agora dezenas de programas de debate, com centenas de salvadores, incluindo – não se sabe porquê – o Herman José, sob o pseudónimo de Ana Gomes, a mulher que mais grita em Portugal. Isto seria normal, se os debates não fossem sempre só dois da RTP à CMTV, apesar da profusão de sábios que tentam ilustrar e esclarecer. Ao fim de algumas semanas já se repetem todos, sem que se perceba esta estranha multiplicação de falatório em pessoas, com livre arbítrio e alguns neurónios no cérebro.
Com tantas faculdades de “comunicação social” devia haver um grupo de investigação para descobrir a origem deste fenómeno, manifestamente típico do génio do indígena e – suspeito – com grandes possibilidades de exportação, pelo menos, para a Venezuela.
O primeiro debate versa sobre a “austeridade”. Os mandatários de Pedro Passos Coelho e de Vitor Gaspar insistem que a ”austeridade” é necessária e o único caminho para tirar Portugal dos sarilhos e da condição básica para começar uma política de crescimento económico e “combater o desemprego” (um eufemismo incompreensível).
A oposição, pelo contrário acha que a “austeridade” está a criar desemprego e a desfazer o “tecido económico” do país, propondo uma “renegociação” com a troika (sem explicar precisamente sobre o quê) e sem a menor ideia se a troika aceitaria esse plano salvífico e perspicaz. Nessa altura, o “debate” costuma degenerar num arraial de feira, em que o moderador se desespera e ninguém ouve o que o próximo está a dizer, de resto com imensa razão, porque o próximo é um agente do mal e do estrangeiro.
Para se distrair, o cidadão comum pode passar para o canal ao lado e tornar a ver o espectáculo com outras caras.
O segundo debate versa sobre o “consenso”, que ninguém se deu à excessiva franqueza de explicar exactamente em que consiste. A troika quer o consenso, por motivos que não se compreendem e que, de qualquer maneira, não convém que a ralé conheça. Como a troika quer, de quando em quando o governo conversa com o PS ou manda uma cartinha ao dr. Seguro, com o propósito de exibir a sua obediência e magnanimidade; e o PS, que se acha “enxovalhado" e “humilhado”, responde com duas pedras na mão. Aqui, chega a altura de o PSD também se sentir “humilhado” e “enxovalhado” e de se cobrir dignamente com a dignidade do Estado. Sucede, ainda por cima, que o PS nunca aceitará a política do PSD, nem o PSD a do PS (ver primeiro “debate”). E é assim que com meia dúzia de horas de “debate” por noite a nata do nosso querido país pratica a democracia e, com dificuldade, vai educando a ralé.

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