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29 setembro 2012

O testamento vital...

Um artigo de Santana-Maia Leonardo
em "Cartas à Directora", no Público de hoje.

Dr. Santana-Maia Leonardo

José Sócrates não foi a causa da nossa desgraça. Pelo contrário, José Sócrates foi o resultado, o produto final, gerado por um sistema político e educativo ineficiente, iníquo e corrompido. O nosso problema é estrutural e tem a ver sobretudo com a forma como nos organizámos.
Como todos sabemos, o novo regime privilegiou sempre o amiguismo e o compadrio ao mérito que, durante muitos anos, identificou com o antigo regime. Pessoa competente e séria era, inevitavelmente, apelidada de fascista.. As escolas, recorde-se, onde se formaram estas gerações, foram tomadas de assalto pelos alunos mais medíocres que expulsaram os bons professores e os substituíram por alunos com o 5º e o 7ººano de liceus cujo único objectivo era nivelar tudo por baixo. Ainda hoje o nosso ensino privilegia  os piores alunos e sacrifica os melhores, sentindo-se subjacente em todo o sistema de ensino público um desprezo incontido pelos alunos mais brilhantes e mais inteligentes. E é precisamente a gente que nasceu e cresceu neste caldo de cultura que ainda hoje domina os sindicatos de professores e o sistema político
Ou seja, todos os poderes decisórios estão hoje na mão de gente medíocre e comprometida com quem lá o colocou.
Tal como num clube desportivo, ninguém pode esperar bons resultados quando se colocam a jogar os afilhados e se sacrificam os bons jogadores. E, no nosso país, nos últimos quarenta anos, só têm jogado os afilhados que, por sua vez, se empenham na eleição de equipas técnicas pouco qualificadas mas que lhes garantem o lugar na equipa. Está tudo viciado. É assim nas câmaras, nas direcções-gerais, nos serviços públicos, nos partidos políticos, nas forças de autoridade, nos tribunais, nos órgãos de comunicação social, nas escolas, nas universidades…
Este regime é um doente onde o tumor maligno da corrupção, do compadrio, da incompetência e da mediocridade se espalhou e ganhou metástases em todos os órgãos. E um doente assim não tem qualquer hipótese de cura.
Aliás, neste momento, a nossa vida é puramente artificial e deve-se exclusivamente ao ventilador da troika. Mas esta situação não se pode manter eternamente. Toda agente sabe que o doente não vai conseguir sair do estado vegetativo em que caiu. As medidas do Governo visam apenas convencer a troika a manter o ventilador ligado por mais algum tempo. Mas o doente, em boa verdade, já está morto. Só falta mesmo dar a ordem para desligar a máquina.
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Santana-Maia Leonardo.
Ponte de Sor
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Santana-Maia Leonardo é um "setubalense do coração". Aqui viveu, com seus pais, ainda "menino e moço", em finais da década de 60.

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