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31 julho 2008

E vai para o outro mundo...

Bocage e Pina Manique

Bocage
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"Os amigos pagavam-lhe os cigarros e a genebra para o excitarem e ouvirem.Neste tempo, Bocage sentia-se filho da simpatia pública; a sua honradez inquebrantável os deveres fraternais que antepunha a tudo, os quadros dos seus desastres, que narrava do modo mais pitoresco, o improviso instantâneo para aproveitar uma rima feliz no meio da conversa, tudo o tornava querido. Era um homem para quem se falava, como se fosse um amigo velho embora fosse a primeira vez que passassem um pelo outro. O botequim que lhe merecia as suas visitas nocturnas ficava acreditado, tinha uma lenda, era concorrido. Logo depois que saiu da prisão claustral, Bocage frequentava especialmente o Botequim do Nicola. Infelizmente, por causa dos sucessos das guerras napoleónicas, Manique mandou espiar as conversas do botequim:
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"Constando nesta Intendência, que numa casa de café, denominada do Nicola, no Rossio desta capital, se ajuntavam diferentes indivíduos, que levados do ócio ali se demoravam só com o fim de entreter conversações e suscitarem assuntos menos próprios, essencialmente na presente conjuntura, que uma bem regulada Polícia não deve tolerar, ordenei ao meu comissário e ministro daquele Bairro, vigiasse com particularidade as pessoas que frequentam a referida casa, e nela não consentisse se demorassem mais o que o tempo preciso, para tomarem os seus refrescos, aliás procedendo contra os transgressores e como entre aqueles indivíduos há alguns que são soldados dos regimentos Auxiliares, que se acham debaixo do comando de V.Exª, vou a prevenir do referido a V.Exª e lhe rogo queira dar-lhe o peso que as suas dilatadas luzes conhecem, e dar-lhe as providências que a este fim julgar oportunas, para que ali se não demorem mais do que o tempo de se refazerem e tomarem os seus refrescos."
("Papéis de Intendência - Contas para as Secretarias, livro VI, a fls 74."

Depois deste documento é que se compreende a bem conhecida anedota de Bocage quando, ao recolher-se para casa, a ronda do bairro o interrogou pondo-lhe a pistola ao peito:
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"Quem é? de onde vem? para onde vai?" Ao que ele respondeu serenamente:
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"É o poeta Bocage
Vem de casa do Nicola
E vai para o outro mundo
Se lhe dispara a pistola
."
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Cfr. “Obras de Bocage”Lello & Irmão - Editores
Maio, 1968
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"Bocage - Sua vida e época literária"
"Estudo biográfico e literário sobre o poeta",
por Teófilo Braga

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