Páginas

25 março 2008

Vieira de Almeida...

A propósito de um apontamento que há dias aqui publiquei sobre os antigos moradores na rua dos Ferreiros, citei o Dr. Adelino Cordeiro como inquilino do 1º andar da casa com o nº 20.
Antes dele, porém, (mas disso já eu não me lembro) viveu ali também o ilustre albicastrense que foi o Prof. Vieira de Almeida
.

Prof.Doutor Vieira de Almeida

“Francisco Lopes Vieira de Almeida nasceu em Castelo Branco em 9.Ago.1888 e faleceu em Cascais, em 20.Jan.1962.
.
"Figura filosófica e cultural de grande relevo na sociedade portuguesa, durante a primeira metade do século XX, Vieira de Almeida foi, enquanto professor, autor e personalidade, um caso invulgar de rigor filosófico e atenção cívica que, embora hoje pouco lembrado, não pode ser esquecido quando se trabalha a história e a cultura portuguesas contemporâneas.” (Carlos Leone)

Não deixa de ser interessante reler o que, sobre o Prof. Vieira de Almeida, escreveu ainda Carlos Leone.
Licenciado e doutorado pela Faculdade de Letras de Lisboa em Filosofia, ingressou como docente na Universidade pelo grupo de História (em 1915). Em 1921 voltou à área de Filosofia onde ascende a catedrático em 1932, mantendo-se em actividade permanente até 1958.
Apesar de entre a sua extensa bibliografia encontrarmos poesia, romance a e teatro, bem como traduções, é a sua actividade como professor e ensaísta na área de Filosofia, e também de História, que o distingue.
Ora, Vieira de Almeida foi (…) um dos raros autores portugueses com trabalhos de relevo em Lógica (e na sua divulgação), mas nunca abdicando de um compromisso político explícito apesar dos dissabores que o regime lhe causou mesmo em idade avançada.
Monárquico, e próximo de autores como Pequito Rebelo e Hipólito Raposo nos alvores da I República, não demorou muito a cativar simpatia noutros quadrantes e não espanta, por isso, ver o seu nome entre os fundadores da Revista dos Homens Livres («Livres das Finanças e livres dos Partidos»), projecto frentista contra a degeneração da República na década de 1920.
(…)
…implantada a ditadura que estará na base do Estado Novo, Vieira de Almeida encontra-se já próximo do grupo Seara Nova, com o qual mantêm contactos, através de Câmara Reys, mesmo depois de António Sérgio se afastar da revista. Era já então uma figura intelectual de referência…
…na ressaca da campanha do General Humberto Delgado e do seu desfecho, encontramos Vieira de Almeida entre os «quatro grandes» (expressão de Mário Soares no volume de homenagem a Vieira de Almeida no centenário do seu nascimento, v. Referências bibliográficas) que se juntam a Delgado para convidar os socialistas Aneurin Bevan e Mendès-France para conferências em Portugal, em 1959.
Impedidas as conferências, e presos os quatro notáveis (além de Vieira de Almeida, Jaime Cortesão, António Sérgio e Azevedo Gomes), o regime tentou voltar à normalidade. Não o conseguindo, não impediu no entanto Vieira de Almeida de morrer em casa, lúcido e comunicativo, estimado pelos mais variados sectores da vida intelectual portuguesa.


==0==
“Em 4 de Junho de 1988, integrada na Romagem de Saudade, foi prestada uma Homenagem àquele ilustre professor de Castelo Branco
São desta data as fotografias que apresento:

O antigo aluno Carlos Alberto Álvares Vaz de Carvalho
lê o elogio do Professor Vieira de Almeida,
seu tio.

A lápide descerrada em 4 de Junho de 1988
na casa onde viveu, na rua dos Ferreiros
.
Quatro antigos alunos do Liceu na homenagem.
O Dr. Ulisses Pardal, o Afonso Ornelas, NN e o Eng.Marques Maia


O filho Vasco Vieira de Almeida e a esposa

Transcrevo um pequeno excerto de uma "conversa" que, há uns tempos atrás, Maria João Seixas teve com Vasco Vieira de Almeida, e que cai muito a propósito neste meu "apontamento", sobre o nosso ilustre conterrâneo:
.
"M.J.Seixas - Vasco, diz-me quem és.
Vasco Vieira de Almeida - Tudo aquilo que eventualmente possa ter de bom, não tenho disso qualquer dúvida, tem uma ligação directa com meu pai, que era uma pessoa extraordinária, em todos os aspectos. Talvez o homem mais inteligente e culto que conheci, com um grande sentido de humor. Era um homem de valores, extremamente simples e tinha uma forma única de comunicar as coisas que sabia e em que acreditava; não as ensinava, comunicava-as porque existia. Nem meu irmão nem eu fomos à escola. Fizémos a primária em casa. O meu pai fez uns livrinhos, um de gramática portuguesa com 16 páginas, um de francês com 20 e tal páginas e um de matemática com 30. E as lições eram dadas conversando. O que aprendi nesses quatro anos de instrução primária, o que ele me quis ensinar e tudo o que me transmitiu sem me ensinar, foi de uma riqueza excepcional.
P. - Estamos a falar dos anos 40?
R. - Sim, isto passa-se na década de 40. Esses anos marcaram-me profundamente e meu pai influenciou-me para o resto da vida. Era senhor de uma grande coragem (foi preso aos 74 anos, depois das eleições do Delgado). Com ele e com o apurado sentido de humor que tinha, aprendi a não me levar excessivamente a sério. Também foi dele que herdei o rigor de raciocínio que, ao longo do tempo e profissionalmente, me tem sido indispensável. Insistia sempre na necessidade de busca permanente de uma sólida lógica interna do pensamento que não permita pôr em causa as conclusões, a não ser que se rejeitem as premissas."

Umas breves palavras de Afonso Ornelas, ouvidas atentamente durante a cerimónia. O Dr.Ulisses Pardal, o Eng.Marques Maia, à direita, e o Domingos"Dominique"Albuquerque(?), das Sarzedas, uma "glória" do Voleibol do Instituto de Santo António, são reconhecíveis na foto.

O casal Vasco Vieira de Almeida ao lado do "antigo aluno" Eng. Manuel da Silva Castelo Branco, antigo Presidente do Município

O 1º andar do nº20, da rua dos Ferreiros

Em 15 de Março de 1998, no programa “Horizontes da Memória” que manteve na RTP 2 por essa altura, José Hermano Saraiva referia-se com grande respeito a Vieira de Almeida que foi seu professor na Faculdade de Letras, em Lisboa. E, também nessa altura, ele punha em destaque a inteligência excepcional do seu mestre... Dizia ele:

“Outro grande Professor que eu tive, daqui de Castelo Branco, era o Dr. Vieira de Almeida... E o Dr. Vieira de Almeida foi o Professor mais inteligente que eu conheci, e todos os meus colegas estão de acordo comigo (aliás já não somos muitos...) mas todos lhes ficámos profundamente gratos por aquele exemplo de inteligência ágil, aguda, penetrante e desmistificadora. Eu nunca vi ir tão longe no exame das coisas.
Eu devo dizer que o Dr. Vieira de Almeida nem sequer se pode dizer que fosse um Professor com muito método... Ele era um Professor de Filosofia, mas não tinha matéria, era só a exibição da sua prodigiosa agilidade mental, mas dar o exemplo da inteligência é uma lição que excede qualquer outra...
Nós todos devemos ao Dr. Vieira de Almeida isso... E ele mostrou-nos o que era ser muito inteligente! E acho que até mostrou neste país quanto vale um bom professor. Mas essa lição não foi seguida. Acho que os novos governantes continuam a não saber quanto vale um bom Professor...
“Estas palavras, proferidas por José Hermano Saraiva fez agora 10 anos, são de uma actualidade que impressiona…”.

==0==

Vieira de Almeida é também uma das “glórias” que tem o seu nome inscrito nas memórias do Liceu de Setúbal.
.
No primeiro Livro de Posses do nosso Liceu, com as datas de 10 de Novembro de 1915, a páginas. 29 – verso, está registada a posse, como professor do 4º Grupo (História), de Francisco Lopes Vieira de Almeida.
.
No mesmo livro, a páginas 31 – verso, e com a data de 8 de Maio de 1916, voltamos a registar a posse de Vieira de Almeida, no mesmo Liceu, como professor do mesmo Grupo (História)
.
Dr.Francisco Lopes Vieira de Almeida, pensador português, professor e escritor, nasceu em Castelo Branco, em 9 de Agosto de 1888 tendo falecido em Cascais em 20 de Janeiro de 1962.
Em 1915 foi nomeado para a secção de Filosofia de Faculdade de Letras de Lisboa e, em 1932, por concurso, ascendeu a professor catedrático da mesma cadeira.
.
Duma vastíssima cultura, e muito erudito, exerce, com as funções de lente da Faculdade de Letras, as de professor do Instituto de Orientação Profissional.
Escreveu Bucólica (Lacrimae Rerum), poesia, 1921-1934, A impensabilidade da negativa (Filosofia, 1922), Introdução à Filosofia Medieval (1926), La Tranchée de Chestov (1934) A obra de Guerra Junqueiro (1934, crítica) etc. Nova Enciclopédia Larousse
Foi ainda colaborador da Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira.

3 comentários:

Inês Patrocínio disse...

Gostei muito do artigo, uma grande homenagem. Sou bisneta do Pr. Doutor Francisco Vieira de Almeida, neta de Vasco Vieira de Almeida. Fiquei muito contente em ter encontrado este blog tao merecido para o meu bisavô. Já mostrei ao resto da família. Vejo que também nasceu em Castelo Branco!São blogues destes que contribuem para a nossa história e cultura. Cumprimentos, Inês Vieira de Almeida Patrocínio.

Unknown disse...

goatei muito de conhecer essa hiatoria pois estudo no joao vieira de almeida

José Daniel Ferreira disse...

Acabo de fazer para o youtube um video com uma entrevista de Igrejas Caeiro a Vieira de Almeida, gravada em 22 de Janeiro de 1957 para a Radio Clube Português. Belissima conversa.

https://youtu.be/LLEWh79pdaE