Páginas

25 maio 2007

Bebé Ribeiro - Olá tá boa?!

Há já muito tempo...no dia 22 de Outubro de 1989, ao ler o Correio da Manhã que era nessa época o meu jornal, chamou-me a atenção um pequeno destaque assinado por Isabel Ribeiro Monteiro a que autora deu o nome de “Olá tá boa?!”

No alto daquela segunda página dei comigo a ler uma série de nomes conhecidos de antigos alunos do meu Liceu de Castelo Branco agrupados no final do texto ali escrito…

Só então aliei o nome daquela autora, ali disfarçado com o nome de casada, com o nome da irmã do João Filipe Ribeiro, a “Bebé” como a Isabel era conhecida no Liceu.


A Maria Isabel Ribeiro, em 1 de Maio de 1982


.
Relata um episódio curioso onde se destacam duas figuras “históricas” daquela “escola de virtudes” que foi o Liceu de Nun’ Álvares: O Reitor Joaquim Sérvulo Correia e o Dr. João do Nascimento Mansinho que foi meu professor de História e também de Geografia…

Reproduzo o texto da Isabel Ribeiro:
“Olá tá boa?!”
Cada vez se simplifica mais a linguagem e com ela a maior identificação e aproximação do indivíduo com outro indivíduo, perdendo-se dessa forma, e com o tempo, algumas interessantes escalas de valores.
Perdeu-se a cortesia discreta, a distancia, os princípios básicos de uma educação tradicional, mas não piegas, o controlo, enfim perdeu-se o mínimo permitido e ganhou-se o máximo proibido. A inversão do chamado “progresso…”
Assim vou presenciando o mundo das coisas que vão acontecendo e fazendo uma ou outra análise medindo diferenças e semelhanças que me dão a razão temática para algumas das minhas crónicas.
Noutro dia uma senhora já de certa idade que passava perto de mim, foi cumprimentada por um jovem seu conhecido que arremeteu à laia de “estou-me borrifando”, com um “Olá tá boa?”. E desapareceu na esquina próxima sem quase dar tempo à senhora de dizer mais que nada…
Depois vêem exemplos aos molhos… O aluno que na rua se desinibe “Olá tá boa?”, o padeiro que arremete à campainha “Olá tá boa?”, a empregada doméstica sofisticada e que trabalha agora como mulher de limpeza na TAP, “Olá tá boa?”, o merceeiro com o lápis na orelha a escolher o melhor para a cliente, “Olá tá boa?”, o canalizador a tentar remendar uma abertura feita não sei como, “Olá tá boa?”. Uma autêntica generalização de costumes! E nesta aproximação franca e desinibida lá vamos perdendo identidades e ganhando estatutos que dizem muito daquilo que o ser humano faz parecer ao miúdo da rua do Passadiço, quando se lhe perguntou um dia o que achava do ser humano, e que ele, com grande espectáculo disse que era igual ao litro…
E depois as recordações de um tempo que já lá vai. Este, um episódio passado no meu tempo do Liceu de Castelo Branco, e porque se teve como modelo original na altura, não resisto à tentação de o apresentar.
Nesta cena são protagonistas os alunos do 7ºAno do referido Liceu que pela sua forma de pensar e de estar nos pareciam, a nós, um pouco mais jovens, homens de aspecto soberbo que a capa e batina evidenciava e punha os corações em turbilhão! Hoje muitos deles espalhados por esta Lisboa e em altos cargos.
Os dois intervenientes na cena: o saudoso Sr. Dr. Mansinho, indigne prof. de História e Filosofia e que muito também me ensinou e aos meus irmãos, da Arte de Dizer, a contracenar e deste modo a estar no palco com outros colegas e em espectáculos que são difíceis de esquecer e fáceis de imaginar, porque se não fazem. Que extraordinária pompa e entusiasmo se punham neles! A récita no final do ano lectivo!



O Dr.Mansinho, na Romagem de Saudade em Junho de 1979

.
A outra personagem trata do ilustre Reitor Dr. Sérvulo Correia, a quem presto, sempre que o recordo como agora, a mais sentida e solene homenagem pelo Homem e extraordinário Reitor que soube ser, muito embora a sua austeridade no tempo escondesse igualmente o melhor dos corações! E é só na distância que apreciamos os grandes Homens e a sua Obra.



O Reitor Joaquim Sérvulo Correia na cerimónia da Última Aula do Dr.José de Sena Esteves

.
…Eram estes os alunos que cumprimentavam com certa solenidade, e como alunos finalistas se assumiam verdadeiramente. A educação era um factor importante no ensino.
Aconteceu, porém, um dia, que o Dr. Mansinho começou a corresponder ao cumprimento apenas com uma elevação de cabeça mas sem proferir quaisquer saudações. Os alunos juntaram-se e resolveram fazer o mesmo. O mestre, indignado, apresenta queixa ao reitor, de que os alunos do referido ano deixaram de o cumprimentar. O reitor chama de imediato os alunos, que sabe ouvir, e depois devidamente informado manda chamar de novo à sua presença o referido professor, dizendo-lhe da conversa tida com os alunos e do que lhe relataram: “O Dr.passa pelos alunos e não fala, apenas faz um ligeiro aceno de cabeça…” ao que este responde de imediato, justificando… “
Mas Sr. Reitor, não vê que eu falo com o pensamento!
Escusado será dizer que foram todos absolvidos.
A Arte era de facto o pensamento constante nele e daí a sua fácil distracção e mesmo gala nesse propósito.
Grandes homens que fizeram à sua semelhança e pela maneira extraordinária de ensinar muitos homens que por aí pululam em cargos de alta responsabilidade.
Vão gostar de ler isto pela recordação desses momentos inesquecíveis!
… E o “Olá tá boa?!” uma mesquinhice a esquecer…
Isabel Ribeiro Monteiro”


A autora acrescentou uma
Nota: Alguns dos alunos intervenientes desse episódio:
General Gonçalves Ribeiro
Engª Maria do Carmo Ribeiro Pinto Elvas
Engº Aquiles Candeias (?!)
Engº Lopes Dias
Engº Preto dos Santos (?!)
Engº Lobato de Faria
Coronel Cabarrão
Dr. José Sérvulo Correia (filho)
Prof. Mª Teresa Pires Antunes
Engº Preto Tomé
Engº Olímpio Matos
Drª Júlia Pedro
E outros.


Penso que há aqui um ou outro pequeno lapso que o tempo, entretanto passado, permitiu…
O denominado “Engº Aquiles Candeias deve ser antes o médico Dr. Aquiles Borronha Gonçalves; o Dr.José Manuel Sérvulo Correia não é para aqui chamado pois andaria pelo 3ºano nessa altura e o Eng. Preto dos Santos deve ser “transformado” em Dr. Preto dos Santos pois é um economista ilustre durante largo tempo ligado à Administração da Marconi e dos CTT.


E, para terminar, um breve apontamento relativo ao Dr. João do Nascimento Mansinho.
Era um homem "um pouco virado para o exterior", um pouco exibicionista... mas um Homem bom, com letra grande!
Fica-nos na memória o seu luxuoso Nash e o motorista que contratou para o transportar a qualquer sítio onde tivesse de se deslocar, um rapaz chamado Curado Ruivo (?) que eu suponho ter sido irmão do cabeleiro José Maria Ruivo, famoso no "metier", na Castelo Branco desse tempo, um bom amigo que era cunhado do, também nosso colega, poeta José Correia Tavares.
Um dia, ainda os jornais eram feitos com base na colocação um a um, dos plúmbícos caracteres tipográficos, um tipógrafo da "Beira Baixa", inadvertidamente, colocou o "n" de modo invertido, no seu nome!
... E o Dr. Mansinho viu-se transformado, de um momento para o outro, no jornal lá da Cidade, em Dr.Mausinho!!! Este êrro foi motivo de muita brincadeira com o nosso professor de Geografia...
Isto não se faz a ninguém... principalmente a um Homem que de "mau" não tinha nada!