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12 novembro 2006

Esplendor na relva - 1961


12.11.2006
A Casa Encantada - João Bénard da Costa






"... De cada vez que pego num livro que conheço bem, não resisto a procurar esta ou aquela passagem e, quase sem dar por isso, estou a reler a obra toda, como se a lesse pela primeira vez.
Como se a lesse pela primeira vez... Parei aqui porque não é nada disso que acontece. O que acontece é que nunca se lê como se leu a primeira vez. O livro não mudou, mas mudámos nós. Aquilo de que tanto gostámos, aos vinte ou trinta anos, parece-nos agora menos conseguido do que a memória o formara. Muita coisa em que nem tínhamos reparado impõe-se-nos com evidência. E a cada vez é diferente."
in' "Público"
12.11.2006


No seu artigo de hoje, João Bénard da Costa fala-nos a propósito de um filme da nossa juventude, realizado por Elia Kazan em 1961 - "Esplendor na relva", com Natalie Wood e Warren Beatty. E diz coisas bonitas como esta que aqui deixo...

"Sou capaz de citar de cor o excerto da Ode of Intimation to Immortality de Wordsworth, que dá o título ao filme e sustenta a mais pasmosa sequência, essa em que Wilma Deannie Loomis (Natalie Wood) entra na aula, de vestido grenat muito escuro e gola de rendas, já sabendo que todos sabem do que se passou entre Bud (Warren Beatty) e Juanita (Jan Norris)... Sou capaz de citar de cor o poema de Ruy Belo dedicado ao filme ou dedicado a Deannie Loomis, "e a sua evolução segue uma linha / que à imaginação pura resiste".
Julgava que era capaz de citar de cor as sequências finais, quando Deannie Loomis, "sabe que passou" "e que jamais lhe será dado ver o que ela era". Mas julga ter ganho força no "what remains behind" e, por isso, regressada a casa, após dois anos e meio de internamento numa clínica psiquiátrica, pede para ver Bud, aquele com quem vivera "the splendor in the grass", "the glory in the flower". Pede é mal dito. Exige-o às atónitas colegas, a quem foi piedosamente recomendado que não lhe falassem de Bud, que a ferida aberta ainda lá estava no corpo e na alma dela. Mas Deannie sabe o que quer. Vestiu-se, com um vestido branco muito bonito, um decote suave em V, saia muito redonda e vestiu-se para aquele encontro.Como esquecer que esse encontro só foi possível porque o pai - tão apagado, tão passivo ao longo de todo o filme - é o único que não lhe mente? Panorâmica para a esquerda e ele a contradizer o mulherio que mente, dizendo não saber da morada de Bud, para dar à filha a exacta localização dela. É então que, pela primeira vez, Deannie Loomis se aproxima do pai e o beija com infinita gratidão. Isso não esqueci. Nem a luz que há lá fora (dia de muito sol) nem a sombra que há lá dentro (casa de muita treva). Nem o bigode branco desse actor Fred Stewart, Mr. Loomis, o pai de Deannie."

in' Público - 12.11.2006

Também J.Bénard da Costa contribuiu hoje, com esta memória antiga, de há 45 anos, ao lembrar um filme que em todos nós deixou gratas recordações...





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